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Museu Dona Beja: a história está em jogo

Museu Dona Beja: a história está em jogo

Há pouco mais de um ano, o maior legado histórico de Araxá segue fechado para visitação.

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Quando um museu é fechado, perde-se parte da história. Nesse sentido, as instituições mantenedoras do passado deveriam ser tidas e acolhidas como entes familiares, provedores de nossa existência. Evitaríamos portanto a perda de traços importantes da nossa história. É o caso do Museu Histórico de Araxá Dona Beja: tê-lo de portas fechadas é o mesmo que negligenciar a história araxaense. Já o mal condicionamento de móveis do período colonial e das peças indígenas que compõem o seu acervo é o mesmo que negligenciar a história do Brasil.

Há de se considerar, no entanto, que o descaso com o Museu Dona Beja tem origem na administração anterior — interrompida abruptamente em 2014, após o prefeito ter sido cassado. Ao assumir às pressas, o prefeito sucessor deparara-se com o descalabro já sacramentado. Uma liminar concedida pelo Ministério Público havia interditado o prédio para reformas. Com efeito, estipularam-se 120 dias para execução das obras sob a ameaça de multa em caso de descumprimento do prazo.

Nada foi feito. O Ministério Público não contava com uma grave obstrução. O prédio do museu pertencia a particulares, aos Diários Associados. O imbróglio inviabilizaria qualquer ação do município. E assim ficou até hoje.

Antes de prosseguirmos para qualquer conclusão, permito-me a resgatar a história de como uma das principais atrações turísticas de Araxá foi parar nas mãos dos Diários Associados. Para tanto, retomemos à década de 1940.

Entre as mais influentes personalidades do século XX, o jornalista paraibano Francisco de Assis Chateaubriand de Melo, dono do Diários Associados, ousou a enveredar-se para outros empreendimentos além do império de comunicação. Grande entusiasta de arte contemporânea, em 1947, Assis Chateaubriand fundaria o Museu de Arte de São Paulo (Masp) — um dos mais importante museu de arte da América Latina.  Pouco depois, Assis Chateaubriand iria aventurar-se nos maiores mercados de arte do mundo, realizando frequentes viagens para Nova Iorque, Londres e Paris, com vistas a adquirir peças para compor o acervo do Masp — sobre o qual o jornalista tinha a pretensão de transformá-lo no maior museu de arte do mundo. A partir de então, Assis Chateaubriand se tornou um respeitável (ainda que às vezes irresponsável) marchand, não só arrematando grandes lances nos leilões, como também contraindo dívidas impagáveis. Gastou muito mais do que ganhou. Tudo por uma exclusiva e única razão: o amor à arte.

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Assis Chateaubriand. 1945. Arquivo do Masp

Quase duas décadas depois da fundação do Masp, Assis Chateaubriand, em 1964, acometido por uma dupla trombose cerebral, foi aconselhado pelos médicos a passar uma temporada no Grande Hotel de Araxá a fim de submeter-se ao tratamento com as afamadas águas sulfurosas. Ao conhecer a cidade, um casarão de arquitetura colonial localizado na região central da cidade saltou-lhe aos olhos. Naquele momento, Assis Chateaubriand decidiu comprar o prédio e transformá-lo em museu — o Museu Dona Beja. No acervo, além acolher a história da mais notável personagem de Araxá — Ana Jacinta de São José —, o jornalista dedicaria o espaço para armazenar peças de uma das suas maiores paixões: a cultura indígena. A propósito, talvez tenha sido este o verdadeiro motivo de ter adquirido e fundado o museu em Araxá.

De volta à situação atual do museu, a história de Araxá segue em jogo. Recentemente tive a oportunidade de acompanhar o deputado estadual Bosco e a presidente da Fundação Cultural Calmon Barreto, Magaly Cunha, em uma reunião para tratar da questão dos museus de Araxá, junto ao secretário de Estado de Cultura, Angelo Oswaldo — uma sumidade no que se trata de cultura.

Naquela oportunidade, em Belo Horizonte, me contive em observar o ímpeto comum de todos em ter o museu reaberto. Inclusive o secretário Angelo, que, conhecedor da causa cultural como só ele, sabe da carga histórica que guarda o Museu Dona Beja.

Ademais, pude identificar um certo quê de Assis Chateaubriand na atual gestora da pasta cultural de Araxá. A verdade é que Magaly não precisava estar ali. Com idade e realizações suficientes para se aposentar, renuncia o descanso a favor da história de Araxá. Tudo por uma única e exclusiva razão: o amor à cultura. Afinal, é a história de Araxá que está em jogo.

Secretário Angelo Oswaldo; deputado Bosco e presidente Magaly Cunha
Secretário Angelo Oswaldo; deputado Bosco e presidente Magaly Cunha

Por Guilherme Scarpellini

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